A Emily se afasta muito dos roteiros de Kate de ‘Castle’,” Stana Katic

Ela ficou conhecida como a detetive Kate Beckett da série Castle, mas a mais recente personagem que Stana Katic dá vida numa série de televisão é bem diferente. Emily Byrne, a protagonista de Absentia, também tem um passado ligado às forças policiais americanas, mas a sua história é mais obscura, quase como os suspenses nórdicos.

A atriz canadense, de ascendência servo-croata, concorda quando traçamos a comparação com a mítica Lisbeth Salander, a heroína improvável dos livros de Stieg Larson. “Ela tem um pouco disso, sim. Está nesse limite“, diz em entrevista ao Delas.pt, durante a passagem por Lisboa para promover a segunda temporada de Absentia. Mas a inspiração para esta personagem, que é mais uma anti-heroína na construção de uma nova identidade e de uma “nova noção de normal”, vai mais longe. As referências então em heroínas e heróis da II Guerra Mundial, a fim a construir personagens reais e críveis, numa história que “é como se fosse um mito, como são as histórias das novelas gráficas, por causa das situações extremas em que as suas personagens são colocadas”, refere Stana.

Em Portugal, a atriz fez um esforço para dizer uma ou duas palavras em português. Aprender o máximo possível da língua dos países enquanto os visita ou passa por eles é algo que ela tenta fazer sempre. Interpretar personagens numa língua estrangeira é algo que ela não descarta, assim como a possibilidade de trabalhar ficção europeia e sul-americana. Por enquanto, é Absentia, série da qual também é produtora executiva, que concentra as suas atenções. Até porque, adianta, já está trabalhando na terceira temporada.

Que desafios a sua personagem enfrentará nesta temporada?
Acho que um dos maiores desafios que a Emily enfrenta nesta segunda temporada de Absentia é a questão da identidade e, no caso dela, é mesmo uma identidade estilhaçada. Trata-se de uma personagem cuja história pessoal está toda virada do avesso e cujos relacionamentos com as pessoas que lhe são mais próximas mudaram completamente. Por isso, acho que o que motiva esta personagem nesta segunda temporada é tentar encontrar uma nova noção de normal e tentar ela mesma se assegurar de que sabe quem é, realmente, para que possa continuar a sua vida, restabelecendo a sua relação com o filho e com as outras pessoas à sua volta.

Tal como a Kate Beckett, de Castle, a Emily de Absentia também é uma agente policial. Você trouxe alguma coisa da sua antiga personagem para esta ou a construiu do zero?
Sim, a Emily era uma agente do FBI antes de ser capturada. Contudo, esta história não se foca inteiramente nisso. Esta personagem é muito diferente da Kate, de Castle, se afasta do roteiro, ou pelo menos, comporta-se assim. Sinto que apesar de ela ter sido uma agente do FBI, isso não é necessariamente definidor. Ela é mais uma renegada, uma rebelde.

Como as heroínas dos livros policiais nórdicos, uma espécie de Lisbeth Salander?
Ela tem um pouco disso, sim. Está nesse limite.

Pode dizer-se que este tipo de personagens são, de certa forma, uma inspiração para a Emily?
A inspiração primordial para criar a Emily partiu do fato de termos uma personagem que está vivendo uma situação extrema, este é um mundo que é muito distante da minha realidade… Vivemos uma existência relativamente segura nos Estados Unidos, na Europa, etc, por isso, para nós, enquanto grupo de produtores era importante encontrar algo que fosse relacionável e fundamentado de forma a desenvolver esta personagem. Então, uma das coisas que fizemos foi olhar para o passado, para a história, de modo a encontrar momentos catastróficos, de certa maneira, que fossem familiares para nós, enquanto criadores de histórias. Entre os que nos concentramos, está a II Guerra Mundial. Estudamos muitas heroínas dessa guerra e também heróis. Foi a isso que nos agarramos para que ela pudesse fazer sentido. Porque, na realidade, para mim, a história de Absentia é como se fosse um mito, como são as histórias das novelas gráficas, por causa das situações extremas em que as suas personagens são colocadas. Portanto, foi realmente importante encontrarmos formas de sustentar os personagens, garantir que a forma como apresentamos as suas emoções, sentimentos e experiências pelas quais eles passam são reais e críveis.

Falando em livros, vi no seu perfil do Instagram que você gosta muito de ler. Os policiais estão entre os seus favoritos ou prefere outros?
Não sei, é uma mistura de tudo, um pouco de história, de ciência, como os do Carl Sagan. O Cosmos é incrível! Ultimamente, tenho lido The Beekeeper’s Bible, sobre as abelhas, que é maravilhoso. E depois há ótimas histórias de ficção. É uma mistura, não há um gênero específico de que eu goste mais.

Também li que fala diferentes línguas.
Mas não falo português [risos].

De onde vem esse interesse por outras línguas?
Para mim, é importante relacionar-me com as pessoas na sua língua, o máximo possível, porque viajamos e estamos expostos a outras culturas e maneiras de viver. Uma das maneiras de nos ligarmos às pessoas é através da sua língua. Portanto, para mim é natural e simpático, quando viajo para algum lugar, tentar aprender o máximo que puder enquanto estiver lá.

Como atriz, suponho que quanto mais línguas falar maior serão as possibilidades e as opções de trabalho. Você vê isso como uma vantagem, para trabalhar com diretores europeus ou de fora da indústria norte-americana, por exemplo?
Sim, sim. Adoraria trabalhar com diretores estrangeiros, estrangeiros, no sentido de trabalharem fora dos Estados Unidos e da América do Norte. Acho que há histórias incríveis que estão sendo contadas na ficção europeia e na América do Sul, por exemplo. Portanto, ter a oportunidade de explorar e vivenciar essas histórias seria fabuloso. Neste momento, na série Absentia, temos três diretores que não são da América do Norte e é ótimo, porque eles têm formas diferentes de dirigirem as câmaras, de entrar na história. É interessante aprender isso com eles, perceber o ponto de vista deles.

E você se vê interpretando uma personagem que fale uma língua completamente diferente?
Sim. Gostaria muito, na verdade. Eu tive de falar com sotaque britânico recentemente num filme e estava com receio de sair dele entre as cenas, portanto mantinha o sotaque durante todo o dia. Foi a primeira vez que senti o que passam os atores britânicos em Absentia, porque todos têm que ter sotaque americano. E é difícil, é mesmo um desafio. Posso imaginar como seria levar isso a um outro nível, ao falar outra língua por completo. Acho que seria emocionante e realmente interessante poder explorar isso, seja em espanhol ou em português, por exemplo, como fazem tantos atores desta parte do mundo quando vão para os Estados Unidos e têm que falar em inglês.

O filme de que fala é Liberté: A Call to Spy?
Sim.

Você interpreta o papel de Vera Atkins, num filme que é dirigido, escrito e produzido por mulheres.
Sim!

O que você pode nos dizer sobre ele e a sua personagem?
É uma história baseada na II Guerra Mundial, uma história verídica de três mulheres que trabalham contra a invasão nazista da França. A minha personagem é a “rainha” das espias, a Vera Atkins, e o Ian Fleming, que escreveu as histórias do James Bond, referia-se a ela em seus livros, dizendo que no mundo dos espiões verdadeiros a Vera era a chefe.

Voltando a Absentia, além de protagonista, você é uma das produtoras executivas da série. O quão importante é estar envolvida também nesta parte do processo?
Absentia tem, de certa forma, uma maneira um pouco vulgar de fazer televisão. A maneira contamos a história funciona como se ela fosse um filme independente para televisão. Portanto, estamos contando histórias como se estivéssemos fazendo um filme. Na primeira temporada, tivemos um diretor para os 10 episódios e filmamos as cenas de acordo com os cenários, o que significava que podíamos filmar, no mesmo dia, o episódio 10, o episódio 7 e o episódio 2. Isso é uma maneira diferente de filmar séries de TV. Estamos fazendo algo que, até certo ponto, é um pouco experimental nesse aspecto. E é realmente maravilhoso fazer parte da equipe criativa e ver os diálogos antes de estar no set de filmagens. Fazer parte da produção executiva foi bom, porque pudemos colaborar de uma maneira que acho que é benéfica para a série. O grande objetivo de todos foi contar uma história envolvente, um suspense emocionante e quando se tem um grupo de pessoas que está empenhado nisso, é divertido. Ainda que discordemos, não faz mal, porque queremos todos atingir o mesmo objetivo, que é contá-la da melhor maneira possível.

Até onde é que sabe antecipadamente o que acontece com a sua personagem, uma vez que está envolvida na parte criativa da série?
Nesta temporada, fomos falando sobre o desenvolvimento da história e já estamos trabalhando no que será a terceira temporada, os roteiristas já estão a trabalhar na ideia que servirá de base às personagens. Em relação à segunda temporada, vi todos os 10 episódios, e como estamos a trabalhar já no que vai ser a terceira temporada já sei um pouco do que vem aí, sim.

Isso afeta o seu lado de atriz? O fato de saber tudo de antemão limita uma certa espontaneidade na evolução da personagem?
Por um lado, todos têm de saber o roteiro com antecedência, por seguirmos a lógica dos filmes independentes. Portanto, para nós, como atores, é bom saber como são todos os episódios, do 1 ao 10, para podermos interliga-los. Há coisas que queremos manter “secretas”, digamos, para nós mesmo, para que possamos ser surpreendidos pela ação. Mas eu gosto desta maneira de trabalhar, em que basicamente temos o filme todo e a história toda antecipadamente, como no cinema.

Para aqueles que não conhecem, não viram a série, é possível começar pela segunda temporada? A história sobrevive de maneira autônoma?
Eu estou entusiasmada com esta segunda temporada porque ela eleva muito o nível. Ela é um suspense psicológico e há sempre muito disso. Eu acho que é importante ver a primeira temporada para se perceber muitas coisas da segunda, mas o que talvez seja verdadeiramente emocionante para o público é que, mesmo não tendo esse prólogo, eles verão que há uma consistência e um arco de ligação comum a todos os personagens e possivelmente isso fará com que eles vão à procura dos primeiros episódios, caso não o tenham feito.

E quem viu, pode esperar muitas surpresas nesta temporada?
Sim. Acho que há muita coisa que o público não espera e que vai acontecer nesta temporada. Há muito mais ação, cada personagem vai se debater com a sua própria noção de moralidade, algumas vezes fazendo ótimas opções, mas muitas outras não. E cada uma dessas escolhas tem impacto em todo o grupo. É claro que seguimos a história da protagonista, a Emily, mas há desenvolvimentos muito interessantes para os outros personagens também.